O visível e o enunciado
by maurici &t santos
Assim, após 6 dias de vida, fui meio que obrigado a destilar minha langue, para que meus pares pudessem me entender.
De outros pouco sei; de mim quase sei e do mundo e das coisas nada sei. Eu não sei. O Amor não é coisa minha. Sobre o que é meu – e que – após dito – da polis, pertence às outras orelhas, ovelhas, ouvidos, sentidos, almas, calmas, estômagos, calcanhares e frieiras. Minha poesia é concreta até virar um gás, que, como tudo o que é sólido, se esvai no ar.
Quem vive por perto, por certo há de ser longe também pois que as redeas não vivem apenas encurtadas. Para todo movimento há a rédea justa.
No fundo cada um tem a sua linguagem, singular e autopoiética. É a poesia do corpo!
Escrevo por usar minhas mãos. Reparto por usar meu timo. Escuto por fazer de meu vazio algo preenchido e, satisfeito, saio pela janela do terceiro andar.
Escrevo como posso. Com a mão errada. Mas pode ser da direita para a esquerda também, como os hebreus, cananeus, samaritanos, caldeus, sírios, egípcios, púnicos, cartagineses, sarracenos, turcos, mouros, persas e tártaros. Estes seguem o curso do movimento diário do primeiro céu, que é muito perfeito, conforme Aristóteles, aproximando-se da unidade.
Estes eu já visitei.
Mas nada tenho com quem escreva da esquerda para a direita como os gregos, georgianos, maronitas, jacobinos, coftitas, tzvernianos, posnanianos e certamente os latinos e todos os europeus, seguindo o curso e movimento do segundo céu; conjunto dos sete planetas.
Estes, também, já estive com eles.
Os indianos, catânios, chineses, japoneses escrevem de cima para baixo conforme a ordem da natureza que deu aos homens a cabeça no alto e os pés embaixo. E os mexicanos que escrevem, quer de baixo para cima, quer em linhas espiraladas como as que o sol faz em seu curso anual sobre o Zodíaco.
São meus conhecidos.
A minha família não é minha mãe, meu pai ou meus irmãos. Eles também o são, mas não o são sozinhos; vizinhos. A minha família é o cervo, a aranha, o ovo, o gelo, o rio, as árvores, as pedras, o grilo, a correnteza, o vento, a abóbora, o galo, o cume da montanha, o seixo, a super nova, a velha, os asteróides, mongolóides, os gnomos, fadas, a pérola, os porcos imundos; e neste mundo, quiça em outros, teço meu tapete que não é meu. Meu tapete, meu arco: como um aríete sou lançado nos braços das bacterias, das almofadas, dos lírios, das salamandras, alcaparras, alcatrazes; dos albatrozes, lêmures, lêndeas; dos canapés, do bolo, do rolo; da miséria me escondo pois meu tapete não voa baixo.
Sou cosmopolita e viajo com muitos outros - seres de um só sexo. O que faz a vida não ser enfadonha é o fato de poder ter, a cada momento, conforme a vontade, a experiência de sentir ser cada um daqueles que me compõe.
Sou de você, sou de ninguém. E me sinto bem, também; aliás, além.
Zen.
100